domingo, 18 de agosto de 2019

A GUINÉ-BISSAU NO TEMPO

A GUINÉ-BISSAU NO TEMPO



Hoje, quando o nosso povo se prepara para solenemente comemorar o 46º aniversário do histórico 24 de Setembro de 1973, o balanço não é nada encorajador e reflecte a nossa gritante incapacidade de aproveitar as enormes potencialidades e oportunidades de desenvolvimento disponíveis e aplicáveis às nossas necessidades e aos objectivos preconizados nas diferentes etapas do nosso percurso histórico.
46 anos depois de termos unilateralmente anunciado ao mundo a existência do Estado livre da Guiné-Bissau e com isso a nossa inabalável determinação de trilhar o nosso caminho e assumir o nosso destino, com base nos valores socioculturais inerentes à nossa sociedade multiétnica e multirreligiosa, tendo em conta a nossa vivência histórica, a conjuntura económica e sociopolítica então vigentes, a correlação de forças na arena política internacional, determinantes das relações e interacções entre povos nações e culturas, o nosso País figura na lista das Nações mais pobres e desorganizadas do mundo, com os principais índices de
desenvolvimento à baterem no fundo da tabela mundial, ferindo profundamente o orgulho, a dignidade e auto-estima  de um povo que com enorme sofrimento, suor, sangue e lágrimas, escreveu das mais belas páginas de resistência dos povos oprimidos pela sua autodeterminação e independência, naquela que é unanimemente sublinhada como a mais bela epopeia de libertação do nosso continente – A Luta de Libertação Nacional dos povos da Guiné e Cabo verde, sob a esclarecida liderança do nosso saudoso Amílcar Lopes Cabral, o prodígio Bafatá.
Foram 46 anos de luta e de imensos sacrifícios, 46 anos de sucessos e insucessos no penoso percurso de consolidação do nosso jovem Estado e da sua afirmação na arena internacional, num esforço e desempenho colectivo que mereceram o respeito, a consideração, a solidariedade, o apoio incondicional e a assistência de todos os povos amantes da paz, da liberdade e do progresso social.
46 anos de um esforço inglório que fez da Guiné-Bissau um País de incertezas, desgastado pela turbulência política e conflitos absurdos que relegam o essencial do desenvolvimento para o segundo plano. Contrariando todas as expectativas que motivaram a Luta de libertação Nacional, a Guiné-Bissau é hoje um canteiro de pobreza, miséria, obscurantismo, intriga, traição, mentira, indefinição, flagrante violação dos Direitos Fundamentais e desta maldita corrupção e generalizada impunidade que sublinham a ausência do Estado, realçando a precariedade da gestão política à que foi sujeito ao longo da sua história moderna.
Há que reconhecer que defraudamos as nossas próprias expectativas e as expectativas dos que acreditavam que eramos capazes de fazer mais e melhor.
Passaram-se 46 anos e dos elogios derivados da celeridade e dinâmica de desenvolvimento registados nos primeiros cinco anos de independência (1975-1980), a Guiné-Bissau encontra-se hoje praticamente ancorado no meio do nada, desprovida de soluções para os mais elementares problemas da actualidade, apesar de em termos “per capita”, ter formado mais
Quadros do que qualquer outro País da nossa Sub-região.
Foram 46 anos de uma sucessão de erros que nos interpelam à viajar no tempo, à dissecar o passado para melhor compreendermos que a história nos oferecia opções mais acertadas, mas que entretanto decidimos avançar pelo pior atalho possível, negligenciando um projecto reconciliador, aglutinador e orientador, imprescindível à união e ao fortalecimento dos alicerces da nação que pretendíamos partilhar com o mundo.
É verdade que o despoletar da guerra fria e a consequente divisão do Mundo em dois blocos distintos (capitalismo e socialismo), condicionaram, e de que maneira, a nossa opção política e ideológica, enquanto povo, cuja libertação se deveu grandemente à ajuda de outros povos. Entretanto, nada justifica a onda de violência que tanta dor, sofrimento e ódio enraizou na nossa sociedade e nos nossos corações, condicionando os empreendidos esforços de paz e de harmonia social – os ensinamentos de Sekou Touré faziam-se sentir num pequeno País cujo povo pretendia num ambiente de paz e tranquilidade, avaliar os pormenores de uma luta
de onze anos, com os seus sacrifícios e sonhos e projectar o futuro, recorrendo às ferramentas, aos exemplos e às vastas experiências positivas acumuladas pela humanidade ao longo da sua história.
O PAIGC que estabeleceu o monopólio do Poder nos últimos 46 anos, continua a definir-se como um Movimento de Libertação, uma formação politica essencialmente eleitoralista, incapaz de se adaptar à nova realidade emergida dos escombros da guerra fria, com a sua onda de modernidade e expansão democrática, baseadas num altíssimo grau de exigência e rigor criterial que interpela à uma minuciosa triagem político-ideológica, trazendo para a ribalta do pirâmide politico universal, os melhores dos melhores, capazes de interpretar correctamente as
necessidades dos povos e de usar com eficiência as ferramentas disponíveis e aplicáveis às resoluções com êxito dos problemas nacionais e internacionais, assegurando desta forma um clima de entendimento, cooperação, paz e segurança mundial.
Foram 46 anos de uma “política” arcaica, anárquica, musculada, violenta e destrutiva, em que, contrariando a essência e a nobreza da verdadeira política, tal como pensada e praticada pela humanidade, enquanto forma que a civilização encontrou para mediar e resolver, de forma pacífica e negociada, os conflitos e as contradições sociais, fomentando a intriga, a divisão social e a intolerância, dia após dia, pedra sobre pedra, invertendo os valores inerentes à nossa cultura e “modos vivendi”, privando o nosso povo dos instrumentos imprescindíveis à capacitação e ao desenvolvimento humano, desafiando os limites do admissível, o PAIGC, cultivou uma mentalidade retrógrada que define o exercício politico como um privilégio e não uma responsabilidade e encorajou o germinar de uma sociedade caótica e perdida no tempo.

Luís Duarte Pinto – Ph.D. em Ciências Agrárias (Agro-Químico) e
Técnico de Contabilidade e Gestão Financeira.



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