segunda-feira, 5 de agosto de 2019

A Guiné-Bissau no concerto das Nações


A GUINÉ-BISSAU NO CONCERTO DAS NAÇÕES

É preciso recuarmos no tempo para percebermos a triste e desagradável realidade histórica que demonstra que a Guiné (antes, durante e depois da colonização) nunca foi um reino de Paz e tranquilidade. Muito pelo contrário, foi sempre fustigado por guerras sangrentas e violências gratuitas, que fizeram dela um baluarte de dor, sofrimento, sangue e lágrimas, por ser uma sociedade muito fraccionada, que na hora de avaliar e de julgar não consegue ser objectivo e justo, recorrendo quase sempre ao sentimento de pertença (étnica, religiosa, regional, familiar, de proximidade (amizade, interesses partilhados, etc.), para decidir o veredicto final.


O esforço colectivo revelado durante a Luta de Libertação Nacional, criou a ilusão de termos finalmente ultrapassado as contradições que inundaram de sangue a nossa história secular e de termos atingido o ponto de convergência nacional, imprescindível a edificação de uma sociedade mais homogénea e tolerante do ponto de vista político e sociocultural.


Infelizmente, a conquista da nossa independência simbolizava apenas a conquista da liberdade colectiva, privando-nos do fundamental (a liberdade individual) e com ela o mais sagrado do Direito Humano – o Direito a Livre Expressão. A onda de perseguições políticas, prisões arbitrárias, espancamentos, fuzilamentos, abusos do Poder, injustiça social e demais formas de violação dos Direitos Humanos, a corrupção, o divórcio entre o saber e o saber fazer e, posteriormente, a tendenciosa “abertura política” proclamada nos anos noventa e defeituosamente implementada, vieram constituir um solo fértil para a germinação dos nossos males do passado (tribalismo, crenças religiosas, regionalismo arcaico, etc., etc.), mergulhando o País num ciclo infernal de conflitos político-militares, colisões institucionais, choques de interesses e permanente instabilidade sociopolítica.
   

Neste momento decisivo da nossa história, quando finalmente começa a despontar a luz ao fundo do túnel, acalentando a esperança do nosso povo mártir num futuro próspero, eis que surgem indícios de um novo conflito institucional no nosso País, ameaçando com novos recuos e adiamentos e em que nenhum cidadão que pauta pelo bom senso deve estar minimamente interessado, na medida em que, os acontecimentos similares do nosso passado recente demonstram que ninguém sai a ganhar com as suas consequências, pelo que cada um de nós deve investir toda a sua influência, sua energia e seu intelecto, para que a nossa Guiné-Bissau não seja novamente adiada e lançada à margem do enorme caudal do desenvolvimento global que tem caracterizado a nossa época.


Considerando que para a Guiné-Bissau não existem alternativas à estabilidade sociopolítica, a vigente situação interpela-nos a adoptar uma atitude responsável e coerente no que respeita a instauração de um clima de paz, de diálogo sério e honesto, de tolerância face as nossas diferenças de pensamento e de acção e sobretudo de respeito mútuo, enquanto pressupostos imprescindíveis à construção de uma sociedade justa, moderna e progressista.


Por conseguinte, urge imprimir um esforço adicional para que se estabeleça um clima de franco e permanente diálogo institucional entre os principais Órgãos da Soberania, com base no Princípio da Partilha do Poder, plasmado na nossa Carta Magna, de modo a imprimir uma nova dinâmica e consensualidade ao processo governativo, neste momento em que o estado da Nação reclama por unidade e assunção colectiva de responsabilidades à todos os níveis.


Sem pessimismos nem exageros, é imperioso reconhecer que a situação que hoje se vive nos bastidores do Poder na Guiné-Bissau é extremamente alarmante, perante a impotência duma Constituição ultrapassada no tempo e incapaz de dar respostas objectivas às questões de fundo da actualidade politica nacional, sobretudo no que concerne às relações e interacções institucionais, carecendo de actualizações (reformas) que contribuiriam para fortalecer o Estado de Direito Democrático, desanuviar o ambiente político, imprimir modernidade e uma nova dinâmica e conceito de liderança e de governação, transmitindo aos nossos parceiros de desenvolvimento uma mensagem de confiança, credibilidade e fiabilidade no funcionamento das nossas Instituições.


A tão sonhada democracia representativa, estabilidade Politica, paz e progresso na Guiné-Bissau requer boa vontade, engajamento e determinação de todos os quadrantes da sociedade, sem excepção, considerando a dimensão das reformas que seremos chamados à realizar e as repercussões que terão na nossa vida e no futuro do nosso País.

·        Torna-se inadiável reformar a nossa Constituição de forma a assegurar que a partilha do Poder nela plasmada, seja um factor de consolidação dos princípios básicos do democratismo;

·        A reforma da lei Eleitoral deve contemplar a realização de eleições autárquicas, atribuindo assim autonomia e acrescidas responsabilidades ao Poder Local, enquanto factor determinante do processo de desenvolvimento socioeconómico;

·        A reforma nos sectores da Defesa e Segurança deverá responder aos imperativos de organizar e apetrechar devidamente as Forças Armadas e da Segurança Nacional, situando-as à altura dos desafios da actualidade (defesa da Soberania e da Integridade Territorial do nosso País e a Luta contra o terrorismo internacional e o crime organizado);

·        A Justiça, enquanto alicerce fundamental do sistema democrático, instrumento que visa a salvaguarda dos Direitos Fundamentais dos cidadãos, deve finalmente desempenhar as funções que lhe são delegadas pela Constituição e corresponder plenamente às mais sagradas expectativas do nosso povo.

·        Todo este conjunto de reformas deve ser precedido de um debate público exaustivo sobre o Modelo de Sociedade que preconizamos para a nossa vivência, com base nas especificidades da nossa composição social e dos valores culturais inerentes e assegurar que tanto a forma como o sistema de Governo (Presidencialismo ou Semipresidencialismo), assim como a própria liderança se enquadrem nesse Modelo de Sociedade.


Dr. Luís Duarte Pinto – Ph. D. em Ciências Agrárias (Agro-Químico) e Técnico de Contabilidade e Gestão Financeira.


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